sexta-feira, 30 de julho de 2010

Bloco: Literatura Digital 22

Ubik
Philip K. Dick

"O odor da transpiração está te deixando isolado? O desodorante spray Ubik e o Ubik roll-on com duração de dez dias acabam com o receio de desagradar, trazendo-o de volta à cena. Seguro se usado conforme orientação, dentro de uma rotina conscienciosa de higiene corporal."

Hoje em pleno século XXI, vivemos em um mundo totalmente consumista e isso não é mistério pra ninguém, mas o que achavam nossos antecessores do século passado onde essa visão compulsiva estava apenas engatinhando? Essa é a mágica que torna os romances de ficção-científica mais atraentes. Muito daquilo que vivemos hoje já foi “profetizado” há muito tempo atrás por escritores que usavam esse gênero para criticar e mostrar onde ia dar o desenvolvimento tecnológico criado pelo homem. Um exemplo disso são os robôs criados por Isaac Asimov. Mas nesse caso quem cria seu próprio mundo (e é o nosso) futurista é o norteamericano Philip K. Dick que possui uma obra extensa e aclamada, mas é em Ubik (Idem, 1969) que a sociedade consumista ganha um viés crítico, profético e por vezes fantasioso.

Antes de tudo somos situados no mundo de Ubik. O cenário é a Terra no ano de 1992 (vinte e quatro anos depois de o livro ser escrito), mas ao contrário do que vivemos de fato, aqui o mundo passa pelo ápice do desenvolvimento tecnológico. É possível identificar também a evolução humana e não apenas das máquinas e do conhecimento. Nosso planeta está habitado por humanos com talentos, ou melhor dizendo, poderes parapsicológicos, em que os mais comuns são telepatas e precogs (que prevêem o fututo), que são conhecidos com Psis. Para cada talento psi existe um antitalento que o anula, são os antipsis (antitelepatas, antiprecogs e outros). O mundo está dominado por grandes empresas, que consomem a vida das pessoas e as sobrecarregam de propagandas de seus produtos.

O homem consegue vencer a morte criando então uma etapa após ela, este seria o estado de meia-vida, onde as pessoas (que tem muito dinheiro) podem armazenar seus entes queridos em locais (moratórios) onde podem entrar em contato por determinado tempo. Os eletrodomésticos e a maioria dos objetos são interativos, mas funcionam somente mediante a pagamento de moedas, o caso mais excêntrico é a porta que necessita de moedas para que se abra, ou seja, caso não tenha nenhum dinheiro você nem entra nem sai, a não ser que alguém o faça uma visita. De todas as empresas duas se sobressaem, a primeira é a Rucinter e Associados uma organização de prudência que contrata pessoas com antitalentos para anular os talentos dos funcionários de sua empresa rival, a Hollis Talentos, que por sua vez contrata seus funcionários com talentos para brigas entre outras empresas menores, numa disputa sem fim de serviços para descobrir segredos e métodos entre umas e outras desse meio consumista de sobreviver.

A “tranqüilidade” é quebrada quando Glen Rucinter, proprietário da empresa antipsi, recebe uma proposta de serviço em Luna (a nossa Lua), ele reúne seus onze melhores funcionários, incluindo Joe Chip, um rastreador e neutralizador, que é nada mais nada menos que seu braço direito. Porém tudo isso trata-se de uma cilada e resulta na morte do poderosíssimo Glen Rucinter (e isso não é spoiller). Joe se ver diante da difícil tarefa de governar a empresa e descobrir quem foi responsável pela morte de seu patrão, mesmo já tendo em mente seu principal suspeito. Em meio às investigações, mensagens escritas por Rucinter começam a aparecer nos lugares mais inusitados, nas paredes dos banheiros, em caixas de fósforos, multas de trânsito e nos rótulos dos mais diversos produtos de consumo.

Mas isso não é o mais intrigante, além disso, a realidade que conhecemos começa a retroceder e voltar literalmente no tempo. As coisas começam a apodrecer, comida começa a estragar rumando à escassez, materiais começam a se desintegrar e outros a involuir para versões mais ultrapassadas, isso se dá até chegar e se estagnar em 1939, época em que os países se atritavam com a Segunda Guerra Mundial. Para evitar o esfacelamento total da humanidade surge um produto que parece ser a solução de tudo: Ubik (esse spray em aerossol que ilustra a capa). Porém apesar de vocês acharem que contei tudo aqui, isso não chega nem perto do que contém esse livro. A partir daí tudo parece se distorcer entrando num limiar entre a lucidez e a loucura, que nos remete a Matrix e os filmes do David Lynch. Chego a me perguntar como seria esse livro adaptado para o cinema por David Lynch?

As referências do livro são muitas e é possível notar até Tolkien e a literatura espiritualista antiga. Aqui são questionados e colocados por determinado ângulo os conceitos de morte, salvação, redenção e tantos outros. Ubik é ainda uma comédia (irônica) metafísica que, não a toa, foi escolhido um dos 100 melhores livros em língua inglesa pela revista Time. O final do livro não deixa a desejar e surpreende ao explicar o verdadeiro significado da palavra Ubik (e aqui preste atenção à chamada do último capítulo). Nessa grafia do título a palavra não significa nada, mas para os que quiserem ter uma noção devo dizer que se trata de uma variação da palavra em latim ubique ou ubiquidade.

Ubik (Aleph, 240 pág.) é apenas uma parte da extensa obra de Philip K. Dick, que é composta por cinco coletâneas de contos e trinta e seis romances, dentre os quais Valis, O Homem do Castelo Alto e o mais recente Os Três Estigmas de Palmer Eldritch foram publicados aqui no Brasil pela editora Aleph. Dick só ficou reconhecido após sua morte, que se deu em 1982, aos 53 anos. Muitas de suas obras já foram adaptadas para o cinema, entre elas O Vingador do Futuro, Minority Report, O Pagamento, O Homem Duplo e o tão conhecido clássico Blade Runner – O Caçador de Andróides. O livro não só é excelente como também muitíssimo recomendado.

Leia um trecho do livro AQUI.

Conheça também o livro Os Três Estigmas de Palmer Eldritc lançado recentemente pela editora Aleph:

Texto Original:
Cooltural Blog de Ademar Júnior

Nenhum comentário: